Está na hora de enfrentar a realidade sobre os nossos artistas preferidos
Não vale a pena continuar a tapar o sol com a peneira. Depois de desmascararmos figuras repugnantes como Louis CK (de quem felizmente nunca mais vamos ouvir falar), chegou a hora de falarmos sobre John Lennon, George Harrison, Eric Clapton, Lou Reed, David Bowie, Iggy Pop, Keith Richards, Anthony Kiedis, Steven Tyler, Jimmy Page e todos os inveterados perpetradores no mundo da música de má conduta sexual em determinado momento nas últimas décadas. Não é por serem ícones culturais e autores de obras que engrandeceram as nossas vidas que devem escapar ao julgamento público. Tal como Kevin Spacey foi apagado do filme "All The Money In The World" (que tinha estreia marcada para este mês), também eles terão que ser inevitavelmente riscados da História em nome da decência.
Em defesa dos bons costumes, de hoje em diante deverá ser imoral ouvir Beatles, Velvet Underground, Led Zeppelin, Rolling Stones e, já que estamos com as mãos no machado, qualquer outra banda Rock que tenha existido (a expressão "Sexo, drogas e Rock 'n' Roll" já diz tudo). Nem vale a pena falar no Hip Hop, no Punk e muito menos no Metal, que isso obviamente terá que ir de vela também. Tudo a deitar esses discos fora. A mim, confesso que custou bastante mandar para o lixo aquela prensagem do White Album de 1978 em vinil branco que tanto estimava. Mas teve que ser. Não posso dar-me ao luxo de ser acusado de cúmplice dos homens asquerosos que estiveram envolvidos na criação daquele álbum.
Se tudo isto vos parece disparatado, é porque certamente o é.
Perguntar-me-ão sobre o dilema de ouvirmos arte produzida por um indivíduo (alegadamente) desprezível. Mas qual dilema? Não há dilema rigorosamente nenhum. A arte deve ser julgada pelos parâmetros da arte e os indivíduos devem ser julgados pelas leis do Homem. É tão simples quanto isto. E muita confusão vai nessas cabeças se existe algum dilema; confusão e desconhecimento da História. Acham mesmo que os vossos heróis levaram vidas puras e impolutas? Lamento, mas não. Nenhum deles. Eles são homens e mulheres como todos nós e estão pejados de defeitos; com a agravante de terem esses defeitos maximizados pelo tratamento faraónico a que muitas vezes são sujeitos.
Não há qualquer mal em perceber que os nossos heróis são humanos e falíveis. Isso pode desiludir alguns fãs que vivem num mundo de fantasia, mas aí o problema é deles, que precisavam de um reality check. Se os nossos heróis infringiram a lei, deverão ser julgados como os demais nos lugares indicados. Mas fora as contas com a justiça, o que eles fazem na vida privada não deveria afectar a apreciação que fazemos da sua arte. Muito menos para condenações sumárias e tentativas de apagamento da História pela Nova Inquisição. E eis que chegamos novamente ao tema da censura.
A brigada inquisitória do politicamente correcto continua a sua senda de sanitização do mundo segundo os seus próprios termos. Começa a ser corrente a tentativa de avaliar arte segundo ataques ad hominem; veja-se o caso do novo filme do Louis CK cujo lançamento foi cancelado, tal como os seus contratos com a FX e a HBO. A censura já não chega, portanto. A pena da moda agora está agravada com o despedimento com justa causa. De repente, regressámos à Idade Média, que não por acaso é recordada como a idade das trevas. Depois de ler artigos que pedem a demolição de estátuas em Roma, estamos um passo a menos de apagar as pinturas de Miguel Ângelo na Capela Sistina que, segundo rezam os historiadores, também não era flor que se cheirasse.
A este ritmo, vamos chegar ao ponto que o Sr Albano da contabilidade vai para a rua porque meteu a mão na cintura a uma miúda no Incógnito em 1997. E nem é preciso meter a mão. Com a criminalização do pedido do número de telefone e esta tendência de retroactivos morais, também eu estou na linha de fogo. E vocês? Estarão a salvo? Nunca tiveram uma acção não criminosa da qual não se orgulham? Porquê parar na má conduta sexual? Todos os pecados são susceptíveis de excomunhão social. Mentiu ao fisco? Despedido. Passou à frente na linha do Pingo Doce? Despedido. Ouviu música muito alto depois das 10 da noite? Despedido. Não sei se isto é o regresso à Idade Média, se um episódio de Black Mirror.
Da minha parte, recuso-me a julgar a arte pelo comportamento do autor. Vou continuar o ouvir o que eu quiser, a ver o que eu quiser e a rir-me com o que eu quiser. E sim, isso significa que vou continuar a ouvir os Beatles, os Led Zeppelin e os Velvet Underground e que me vou continuar a rir com as piadas do Louis CK. E ninguém tem nada a ver com isso.
Perguntar-me-ão sobre o dilema de ouvirmos arte produzida por um indivíduo (alegadamente) desprezível. Mas qual dilema? Não há dilema rigorosamente nenhum. A arte deve ser julgada pelos parâmetros da arte e os indivíduos devem ser julgados pelas leis do Homem. É tão simples quanto isto. E muita confusão vai nessas cabeças se existe algum dilema; confusão e desconhecimento da História. Acham mesmo que os vossos heróis levaram vidas puras e impolutas? Lamento, mas não. Nenhum deles. Eles são homens e mulheres como todos nós e estão pejados de defeitos; com a agravante de terem esses defeitos maximizados pelo tratamento faraónico a que muitas vezes são sujeitos.
Não há qualquer mal em perceber que os nossos heróis são humanos e falíveis. Isso pode desiludir alguns fãs que vivem num mundo de fantasia, mas aí o problema é deles, que precisavam de um reality check. Se os nossos heróis infringiram a lei, deverão ser julgados como os demais nos lugares indicados. Mas fora as contas com a justiça, o que eles fazem na vida privada não deveria afectar a apreciação que fazemos da sua arte. Muito menos para condenações sumárias e tentativas de apagamento da História pela Nova Inquisição. E eis que chegamos novamente ao tema da censura.
A brigada inquisitória do politicamente correcto continua a sua senda de sanitização do mundo segundo os seus próprios termos. Começa a ser corrente a tentativa de avaliar arte segundo ataques ad hominem; veja-se o caso do novo filme do Louis CK cujo lançamento foi cancelado, tal como os seus contratos com a FX e a HBO. A censura já não chega, portanto. A pena da moda agora está agravada com o despedimento com justa causa. De repente, regressámos à Idade Média, que não por acaso é recordada como a idade das trevas. Depois de ler artigos que pedem a demolição de estátuas em Roma, estamos um passo a menos de apagar as pinturas de Miguel Ângelo na Capela Sistina que, segundo rezam os historiadores, também não era flor que se cheirasse.
Se começarmos a querer reescrever a História e a apagar a arte dos pecadores, no fim de contas só ficaremos com os discos dos Anjos (e não sei até que ponto é que os manos Rosado não praticaram algumas patifarias com as suas fãs nos loucos anos 90). Pensem bem se querem subir ao pedestal dos moralistas porque então aí têm que mostrar consistência e no mínimo, serão obrigados a desfazer-se dos vossos artistas preferidos. Estarão dispostos a isso?
Da minha parte, recuso-me a julgar a arte pelo comportamento do autor. Vou continuar o ouvir o que eu quiser, a ver o que eu quiser e a rir-me com o que eu quiser. E sim, isso significa que vou continuar a ouvir os Beatles, os Led Zeppelin e os Velvet Underground e que me vou continuar a rir com as piadas do Louis CK. E ninguém tem nada a ver com isso.
Caro Nuno Bento.
ResponderEliminarEntendi em parte sua "indignação".. Só não compreendi a parte de lançar ao luxo certos testemunhos asquerosos e nesse sentido ofereço-me para recolha dos discos para assim entender melhor.😁