quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

Celebrar o Natal com as 10 melhores canções sobre homicídio

É Natal, é Natal, tralalalala. E estas são as 10 melhores canções sobre assassinatos.

Natal é tempo de paz, harmonia e daquelas playlists com canções que passam em centros comerciais para maximizar as vendas. E centros comerciais à pinha de gente a ouvir o "Adeste Fidelis" são lugares propensos a ideias desviantes. Tempo por isso para uma resenha de canções sobre homicídios. Não falo de referências metafóricas como a morte em "Bohemian Rhapsody" ("Mama, just killed a man..."), ou o afogamento que nunca aconteceu em "In The Air Tonight" ("if you told me you were drowning, I would not lend a hand"). Isto é homicídio, assassinato, supressão da vida. Percebem onde quero chegar.

10. Guns N' Roses — "Used to Love Her" (1988)



O homicídio como break up.

"I used to love her, but I had to kill her" — aquela vontade de enterrar a nossa amada sete palmos debaixo da terra. Quem nunca? E mesmo depois de ir de vela, "I can still hear her complain".

Na verdade, segundo Slash, o tema não é sobre uma ex-namorada de um dos Guns, mas sim sobre o cão de Axl Rose que estava doente e teve que ser abatido. Mas não deixemos a verdade intrometer-se no meio de uma história bem mais interessante, não é?

9. Eric Clapton — "I Shot The Sheriff" (1974) 



O homicídio como defesa.

O protagonista do tema de Bob Marley queria defender-se da acusação pelo homicídio do adjunto do Xerife e para isso... admitiu que baleou o próprio Xerife. Negar um crime, confessando outro — uma técnica sui generis de defesa, ou aquele charrito a mais. Para a próxima talvez seja melhor ideia planear a defesa só depois de passar o efeito da moca.

Marley era odiado pelo Xerife da cidade e embora defenda que não sabia porquê, admite que podia ter a ver com aquelas plantinhas que ele tinha a crescer lá no jardim. (na verdade, esta parte era sobre a pílula contraceptiva que a namorada tomava contra a vontade de Bob, mas mais uma vez a verdade não é tão interessante como a nossa imaginação)

Bob Marley escreveu "I Shot The Sheriff" em 1973 para o álbum "Burnin'" dos The Wailers. O álbum chegou a Eric Clapton, que não só incluiu um cover de "I Shot The Sheriff" no seu álbum de rehab "461 Ocean Boulevard" — gravado depois de 3 anos de dependência de heroína  —, como também o lançou em single. A versão de Clapton atingiu o primeiro lugar nos Estados Unidos e acabou por alavancar a difusão da música de Bob Marley e do Reggae no mercado americano.

8. GNR — "Bellevue" (1986)



O homicídio como misericórdia.

Se o homicídio em "Bellevue" não é um acto altruísta, é pelo menos inofensivo, ou não fossem as vítimas desempregadas. Que diferença fazem eles à sociedade? — desculpa-se o protagonista imaginado por Rui Reininho, pelos corpos que deixou a boiar no lago "só para brincar ao cinema negro". Sem mais amigos de sobra, todos enterrados no jardim, o homicida esconde-se solitário na Bellevue, encarcerado na sua própria prisão.

Muito curioso perceber que a referência aos "amigos enterrados no jardim" constante da letra original (e reproduzida na primeira prensagem de "Psicopátria") foi alterada à última hora na gravação do tema para "as minhas amiguinhas lá no jardim", que é a linha que se ouve na versão do álbum. Talvez os GNR achassem que a letra estava demasiado mórbida. E estava mesmo. Exactamente por isso é que era melhor.

Foto do LP original de "Psicopátria" cortesia de Paulo Garcia, radialista da Radar FM

7. Peter Gabriel — "Family Snapshot" (1980)



O homicídio como espectáculo.

Peter Gabriel escreveu "Family Snapshot" com base no livro "An Assassin's Diary" de Arthur Bremer (1973), um homem que vivia obcecado com a ideia de se tornar uma celebridade a qualquer custo. Inspirado pelo assassinato de John F. Kennedy em 1963, Bremer planeou o homicídio de Richard Nixon como a forma mais fácil de se tornar famoso e só quando percebeu que tal seria extremamente difícil (Nixon era o presidente dos EUA na altura), mudou o seu alvo para George Wallace, político que defendia a segregação racial.

Bremer pretendia obter a maior cobertura mediática possível, pelo que temporizou o ataque de forma a aparecer nos jornais da noite na Europa e de fim de tarde nos Estados Unidos. Chegou até a pensar num soundbite para gritar enquanto atirava em Wallace — "A penny for your thoughts!"—, mas com o nervosismo do momento, esqueceu-se.
Wallace sobreviveu, mas ficou com uma bala alojada na coluna e por isso paraplégico para o resto da vida.

"Family Snapshot" acompanha o carrossel emocional do assassino, desde a frieza durante o planeamento do ataque, passando pelo turbilhão nervoso no momento do tiroteio, até à depressão pós-clímax, em que se apercebe que tal como quando era criança, só queria ter a atenção dos outros.

6. Talking Heads — "Psycho Killer"



O homicídio como desporto.

"Psycho Killer" não é propriamente um tema sobre um homicídio. É sobre muitos. Aqui, o foco de David Byrne é o próprio homicida, um sociopata que age em regime compulsivo. É um dos raros temas que nos conduz à mente tensa, turva e elíptica de um serial killer.

"Psycho Killer" é uma canção nervosa, ansiosa e psicótica; um clássico de culto que se tornou o ex libris dos Talking Heads. Não admira por isso que fossem a banda preferida de Patrick Bateman de "American Psycho" (infelizmente esta informação só aparece no livro e foi omitida no filme de Mary Harron).


5. Nirvana — "Where Did You Sleep Last Night" (1994)



O homicídio como alienação.

"Where Did You Sleep Last Night" tem origem num tema muito antigo. "In The Pines" é um clássico do cancioneiro norte americano que remonta a 1870 (!!!) e que em diferentes iterações ao longo das décadas (dos séculos!) conta a história de um/uma amante (depende do sujeito) que se portou mal aos olhos do protagonista e de um marido/mulher cuja cabeça foi encontrada ao volante de um carro e o corpo nunca foi encontrado. Independentemente dos detalhes da história, o importante são as emoções obscuras de alienação, traição e culpa, sentidas pelo protagonista. Todas elas estavam próximas de Kurt Cobain aquando da interpretação que vemos em cima, no programa Unplugged da MTV.

Até eu — longe de ser o maior fã dos Nirvana — sou tomado pela intensidade de Kurt Cobain neste tema. Atentem no Kurt aos 4:15 deste vídeo. É um olhar que vale por mil palavras.


4. Elton John — "Ticking" (1974)



O homicídio como massacre.

Bernie Taupin viu em Elton John o parceiro ideal para musicar as histórias de bandidos saídas do seu imaginário. Os exemplos ao longo dos anos foram inúmeros, mas destaco "The Ballad of Danny Bailey (1909-34)" (1973), obra-prima maior de Elton que conta a história da (curta) vida errante de um pistoleiro no faroeste americano e "I Feel Like a Bullet (in the Gun of Robert Ford)" (1975), que compara o comportamento de Bernie no seu casamento à bala fatal que atingiu pelas costas o fora-da-lei Jesse James. Qualquer um destes temas seria candidato a esta lista, mas nenhum deles retrata um massacre como "Ticking".

"Ticking" é um épico que conta detalhadamente a história de um jovem calmo de classe média e boas notas na escola ("an extremely quiet child"), que um dia se passa da cabeça, entra num bar em Queens (NY) com uma caçadeira e mata toda a gente lá dentro. Uma história do imaginário de Taupin em 1975, mas que poderíamos ver nas notícias a qualquer momento nos dias de hoje.


3. Rage Against The Machine — "Killing In The Name" (1992)



O homicídio como ódio.

Não há nada de imaginário acerca do tema mais célebre dos Rage Against The Machine. "Killing In The Name" é sobre o inexplicável espancamento do taxista afro-americano Rodney King por 4 polícias da LAPD em 1991, os quais foram absolvidos em julgamento apesar das provas em vídeo. Quando as imagens foram parar às televisões, a revolta popular foi de tal ordem que se deram violentos motins em Los Angeles.

Os Rage Against The Machine (que no nome dizem logo ao que vêm) canalizaram esta revolta em música e o resultado é o superlativo "Killing In The Name". O tema teve várias vidas desde o seu lançamento original em 1991 e em 2009 lideraram a icónica Christmas Chart do Reino Unido, devido a uma campanha no Facebook destinada a impedir o single do X-Factor de ser nº 1 no Natal.


2. Pink Floyd — "Careful With That Axe, Eugene" (1969)



O homicídio como arte.

"Careful With That Axe, Eugene" é provavelmente o melhor tema de sempre sobre homicídio. Ou não. Fuck knows. Não sei eu e na verdade ninguém sabe o que em nome de Freddie significa este Mauna Kea psicadélico. Mauna quem? Mauna Kea, amigos, Mauna Kea — o ostracizado vulcão havaiano que é, ele sim, a montanha mais alta do mundo (isto é, que tem a maior distância altimétrica entre a base e o topo (10.2 km), em oposição ao popular rei-do-baile Monte Evereste, que é simplesmente a montanha de maior altitude (8.85 km) — e ora aí está um pouco de trivia para os meus pacientes leitores).  Mas porquê o Mauna Kea? Porque é hipster? Claro, mas mais que isso porque é um vulcão. E "Careful With That Axe Eugene" é um vulcão muito, muito zangado, que entra em erupção sempre que apertam os tomates ao nosso Roger o nosso Roger manda um daqueles gritos maníacos para dentro (já repararam? ele grita para dentro!), logo a seguir a suspirar "careful... careful... wi-that-axe Eugeeeeene". Mas divago.

A metáfora da montanha pretendia descrever a estrutura Gaussiana do tema, começando na calmaria aquática das profundezas do Pacífico, subindo paulatinamente até ao momento do homicídio — aquando do grito de Roger — e depois afundando novamente até ao silêncio absoluto do oceano. Estruturalmente, "Careful With That Axe Eugene" é perfeito. Só não é certo que o tema retrate mesmo o homicídio do pobre Eugene, não sendo conhecido (e ainda bem) o real significado do tema mais misterioso e intenso da discografia dos Pink Floyd. Não há aqui qualquer palavra discernível, só o grito maníaco da morte.


1. Nick Cave and the Bad Seeds + Kylie Minogue — "Where The Wild Roses Grow" (1995)



O homicídio como o epítome do romantismo.

"Where The Wild Roses Grow" conta a lenda de Elisa Day, de quem se dizia que era tão bonita como as rosas silvestres que cresciam à beira do rio. É uma história de amor que acaba com a morte de Elisa, porque "toda a beleza deve morrer". A supressão da vida como a expressão máxima da paixão. Um sentimento tão grande que a vida não pôde conter. Ou haverá algo mais visceral que o homicídio?

O tema de Nick Cave (a fazer de assassino, com Kylie Minogue a fazer de Elisa) é uma história de amor com fim trágico... ou será que é? Falta contar o outro lado da história. Elisa vivia infeliz. Ela esperou toda a vida por um amor torrencial, mas estava condenada a ser tratada como um bibelot por homens que viam nela um mero troféu. "I wish I was scared that you killed me, but I guess that will never happen." — pensou tantas vezes com antigos namorados. Quando finalmente chegou à cidade um homem que a amava com toda a intensidade que sempre sonhara, ela não se assustou quando o viu com uma pedra na mão e lhe sussurrou "all beauty must die". Elisa respondeu com a calma de quem sente um amor maior que a vida — "You can murder me if you want" — e deixou pacificamente que ele esmagasse a sua cara à beira rio, onde o seu fantasma vive desde então.


25-11. Menções honrosas

15 temas que não entraram na lista, mas poderiam ter entrado.

25. Sufjan Stevens — "John Wayne Gacy Jr." (2005)
24. The Decemberists — "Shankill Butchers" (2006)
23. The Police — "Murder By Numbers" (1983)
22. Richard Marx — "Hazard" (1991)
21. Tom Waits — "Murder In The Red Barn" (1992)
20. Bob Dylan — "Hurricane" (1976)
19. The Smiths — "Suffer Little Children" (1984)
18. Bauhaus — "Bela Lugosi's Dead" (1979)
17. Johnny Cash — "Folsom Prison Blues" (1957)
16. The Beatles — "Maxwell Silver Hammer" (1969)
15. Pearl Jam — "Jeremy" (1991)
14. Bruce Springsteen — "Nebraska" (1982)
13. Neil Young — "Powderfinger" (1979)
12. Misfits — "Die Die My Darling" (1984)
11. Eminem ft. Dido — "Stan" (2000)

Para finalizar, uma playlist com o serviço completo. É muita morte junta.
Feliz Natal, madafacas.

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