sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Os melhores concertos de 2016 em Portugal — Top 10

Porque os balanços só se fazem no fim, eis o meu Top 10 dos melhores concertos que vi em solo nacional durante 2016.

10. Pop Dell'Arte - 22 de Abril - Titanic Sur Mer, Lisboa


No meio da miríade de ocorrências do quotidiano, a memória humana tem tendência a guardar três tipos de eventos: os bons, os maus e os WTF?!. A noite em que vi os Pop Dell'Arte versão 1995 reunidos (excepção ao baixista Pedro Alvim, que morreu em 2015) para tocar na íntegra o álbum "Sex Symbol" — por ocasião da sua reedição em vinil — encaixa porventura na terceira categoria. Obrigando os sentidos a constantes readaptações, os Pop Dell'Arte começaram na electrónica jazzista de "All You Need Is Money", passaram pelo viciante "My Funny Anna Lana" (que não sai da cabeça durante dias a fio), mostraram o crooner João Peste em "Planet Lakroon" e abriram alas à guitarra facínora de JP Simões em "Zip Zap Woman". Noite para nunca esquecer.

9. Destroyer - 10 de Junho - Parque da Cidade, Porto (Primavera Sound)


10 de Junho foi um dia cheio. A segunda jornada do Primavera Sound teve Brian Wilson, PJ Harvey, Savages, Destroyer, Dinosaur Jr., Beach House... Não deu para ver tudo, mas deu para apanhar uma das bandas que tenho seguido mais de perto nos últimos anos: os Destroyer. A (enorme) banda de Dan Bejar encheu o Parque da Cidade do Porto com a sua cortina sonora, tão depressa num registo agressivo-depressivo a fazer lembrar New Order, como num registo eufórico-festivo a parecer a E Street Band. Bejar esteve igual a si próprio e, tal como fez no Music Box em 2012, despejou sucessivas latas de cerveja alternadas com copos de whiskey durante todo o concerto, ao mesmo tempo que despejava a alma em palco. Nunca falha, o Dan.

8. The Parkinsons - 28 de Novembro - Sabotage, Lisboa

Vou deixar as imagens falarem por si.






7. The Cure - 21 de Novembro - Meo Arena, Lisboa



Os concertos da Tour 2016 dos The Cure dividiram-se em dois tipos: os espectáculos com severo enfoque no álbum "Disintegration", que contaram com 7 a 8 temas do álbum (e que correspondem por si só 70 a 80 minutos de música) e os outros. Como fã agressivo do álbum de 1989, foi com muita pena que vi o concerto de Lisboa inserir-se no pacote dos "outros". O concerto foi muito bom e mereceu lugar nesta lista mas — mesmo admitindo que tenha havido um problema de gestão expectativas — it didn't live up to the hype.

6. Bryan Adams - 25 de Janeiro - Meo Arena, Lisboa


Já tinha visto Bryan Adams no Rock In Rio a abrir para Stevie Wonder e a deixar o cabeça de cartaz muito para trás. Foi por isso sem surpresa que vi Bryan dar mais um concerto imaculado no Meo Arena, onde desfilaram hits em barda e, para ser perfeito, só faltou mesmo o "Tonight". Ah e desta vez não tivemos um dueto "aleatório" com a Vanessa Silva.

5. Elton John - 11 de Dezembro - Meo Arena, Lisboa


O tio Elton nunca desilude. Com 69 anos e ainda mais de 100 concertos por ano, Elton John é o Mestre absoluto do espectáculo ao vivo. Foi uma maratona de quase três horas de concerto, onde Sir Elton discorreu êxitos, fan favourites, deep cuts, singalongs e ainda teve tempo para umas canções de Natal. De encher o coração.

4. AC/DC & Axl Rose - 7 de Maio - Passeio Marítimo de Algés


O evento de maior relevância internacional de 2016 em espaço português, a fazer corar o Websummit e a inauguração do hotel do Cristiano Ronaldo. Era o primeiro concerto dos AC/DC com Axl Rose e meio mundo adivinhava um cataclismo de proporções épicas. Eu não, que já previa que ia ser do caralho. E assim foi. Qual Rocky a treinar para o Ivan Drago, Axl passou uma semana a ensaiar na tundra de Xabregas (lembram-se como choveu naquela semana?) e quando chegou domingo, estava preparado. À espera dele em Algés, estava um batalhão de jornalistas estrangeiros maior que o destacado para o Tratado de Lisboa, a final do Euro 2004 e a chegada do Caniggia ao Benfica, todos a acotovelarem-se slimaniscamente para um lugar na primeira fila do desastre do século. Mas o universo tem destas coisas: quando o concerto começou, a chuva furiosa parou e Axl desabrochou para uma performance histórica que quem ali esteve jamais esquecerá. Quem queria sangue, foi para casa com a viola no sangue. A esta hora ainda deve ecoar no Passeio Marítimo de Algés o pull the triggaaaaaaaaaaaaaaa.

3. Brian Wilson - 10 de Junho - Parque da Cidade, Porto (Primavera Sound)


Por falar em performances históricas, Portugal teve em 2016 a honra de receber Brian Wilson a tocar “Pet Sounds”, o lendário álbum dos The Beach Boys. Trazer Brian Wilson a um festival estava longe de ser uma contratação óbvia. Basta olhar para o cartaz, onde não se vislumbra nenhum artista passível de aparecer nas sugestões do Spotify de quem ouve The Beach Boys; ou para resto da digressão cheia de "coliseus", salas sentadas onde "Pet Sounds" se podia ouvir com a merecida atenção. A organização foi corajosa e acertou.
Foi um concerto especial. Para ser cruelmente honesto, Brian apresentou-se com a voz audivelmente cansada, incapaz de atingir as alturas agudas de outros tempos. A vida não foi meiga com ele (vejam o "Love And Mercy" para terem uma ideia das tormentas que o homem passou) e depois de um ano de digressão exaustiva, Brian chegou ao Porto debilitado. Mas nem por isso fez uso de redes, playbacks, ou outros truques. Foi tudo "as is", nu, cru e ao vivo. O público respeitou-lhe a pureza e preferiu concentrar-se no que Brian trouxe de bom, que foi tudo o resto. Começando na música, claro está. Não será preciso dissertar sobre a magnificência de "Pet Sounds", bem representada na banda de doze elementos que Brian trouxe e no arsenal de instrumentos insano que mal cabia no palco principal do Primavera. Até porque o que me atrai em "Pet Sounds" é a sua ingenuidade feliz e despreocupada. Por trás da cortina sonora, temas como "Wouldn't It Be Nice" e "God Only Knows" primam pela sua universalidade, capaz de unir uma plateia heterogénea que terminou com surf — crowdsurf — numa tarde fria no Porto.

2. Iggy Pop - 15 de Julho - Meo Arena, Lisboa (Super Bock Super Rock)

Todos temos a nossa lista dos artistas que gostaríamos de ver. Uma "bucket list", como lhe chamam agora. Iggy fazia parte da minha lista — embora longe da posição de proa —como um dos poucos astros do Rock ainda vivos, numa lista onde hoje só cabem apenas nomes como Mick e Ozzy. Já não há muitos para ver, uns já nos deixaram, outros ficaram e murcharam e poucos valem o valor do bilhete que cobram. O SBSR agarrou um dos poucos que sobraram e se já esperava que fosse um dos pratos fortes do festival, mas acho que ninguém estava preparado para o que aconteceu naquela noite escaldante de Julho.
Iggy apresentou-se na sua indumentária habitual, isto é, sem indumentária (devido àquela condição clínica que não lhe permite vestir uma t-shirt). Ostentando as gloriosas pregas que apresenta no torso — cicatrizes de muitas batalhas travadas no passado —, deu um concerto com o pedal a fundo do princípio ao fim. Cerveja a voar, Iggy a cuspir, público a saltar, mosh, crowdsurfing, este é o meu povo e é disto que o meu povo gosta. É só Rock N’ Roll, mas nós gostamos.
P.S.: e eu dei um high-five ao Iggy!

1. Bruce Springsteen & The E Street Band - 19 de Maio - Parque da Bela Vista, Lisboa (Rock In Rio)



Vamos pôr as coisas desta forma: não é justo sequer por Bruce Springsteen ao lado dos anteriores desta lista. Não é justo para os restantes, que saem inevitavelmente a perder contra o Boss. Já começam a faltar palavras para descrever esta experiência quase metafísica que é viver um concerto do Bruce. E é impossível fugir aos superlativos. Melhor concerto de sempre em solo português? Bem, o melhor desde o último de Bruce, certamente que foi. Concerto do ano também.

0. David Gilmour - 7 de Julho - Anfiteatro Romano, Pompeia


Esqueçam o aparente pretensiosismo que acarreta a escolha de um espectáculo em Itália para fechar um Top 10 de concertos em solo nacional. Atentem na data do concerto. Devem ter reparado que  nesta lista não figura qualquer concerto do Alive. Provavelmente já me estavam a rogar pragas e a perguntar onde estão Radiohead, Tame Impala, Pixies, Robert Plant, Band Of Horses, ou Father John Misty. Acreditem, nada me move contra o festival e muito menos contra o cartaz deste ano (um dos melhores de sempre). Eu tinha bilhete e simplesmente não pude ir porque não podia perder a oportunidade de uma vida de ver o David Gilmour ao vivo nas ruínas de Pompeia. E quanto a este concerto só digo uma coisa: depois disto, sinto que já não há mais nada para ver.