Esta segunda-feira, 10 de outubro, é o Dia Mundial da Saúde Mental e eu venho falar-vos da importância de dar atenção a este tópico fundamental, tanto pelos que vivem à vossa volta, mas fundamentalmente por vocês. Eu sempre fui um privilegiado no campo da saúde mental. Em primeiro lugar, porque cresci e sempre vivi rodeado de uma estrutura familiar forte (ainda que eles vivam longe de mim há mais tempo do que viveram comigo); depois, porque quando as coisas ficam mais pesadas, consigo ultrapassar a tormenta com maior ou menor dificuldade, quase sempre através da alavanca da música.
A minha relação com a música sempre foi muito maior do que a de um mero passatempo. Desde que me lembro de existir que levo a música muito a sério, como uma paixão exacerbada. Mas esta paixão e dedicação que eu tenho pelo música, que me leva a escrever estas crónicas semanais, a colecionar discos, ir a concertos e, mais do que quero admitir, a organizar a minha vida à volta da música, não é mais que apenas uma retribuição de tudo o que ela me dá. De tudo o que ela me deu ao longo da minha vida.
Por exemplo, durante o período particularmente difícil da minha adolescência, não me identificava com nada à minha volta. Hoje sei que não fui o único, mas naquela altura olhava em volta e via toda a gente a divertir-se mais que eu. Todos pareciam viver viver confortáveis com eles mesmos, menos eu. E isto desaguava num sentimento de solidão, mesmo estando rodeado de pessoas. Hoje penso que a única razão por que sobrevivi àqueles anos foi a música. Fechava-me no quarto, mas ali viajava a descobrir música na (velha) Rádio Comercial, na MTV, no VH1, e no Kazaa. O meu pai chamava-lhe o bunker, mas viajei mais ali que no Lancia Dedra dele (ok também viajei muito naquele carro).
A crescer, para mim era tão óbvia a relação entre música e terapia, que quando o meu tio morreu — tinha eu 12 anos e sem experiência de lidar com a morte e sem saber o que dizer à minha prima —, o meu primeiro instinto foi gravar uma cassete com o “The Division Bell”, dos Pink Floyd (estávamos nos anos 90), e enviar-lha pelo correio. Juntei uma nota que dizia “Não faço ideia do que é perder um pai, mas eu quando estou triste ouço este álbum. Espero que te ajude”. Não sei se o “The Division Bell” ajudou alguma coisa, mas acho que isso não é importante. O importante, neste caso e em todos os casos de pessoas que estão a passar por dificuldades na sua saúde mental, é estarmos lá. Levantarmos o braço e dizermos, “eu estou aqui para o que for preciso”.
Soluções diferentes resultam para pessoas diferentes. O Liam Gallagher diz que, para ele, é o John Lennon. Sempre que ele sente as nuvens negras a passar, basta ouvir o John e elas dissipam logo. Para mim, é o Freddie Mercury. Ouvir a voz dele acalma-me imediatamente. Ou a guitarra do David Gilmour. Quando passava por um tempo difícil há uns anos, fui vê-lo a Londres por impulso (na altura vivia em Lisboa) e chorei durante as duas horas de concerto (com vários temas do “The Division Bell”, claro). Ouvi o que a sua guitarra tinha para me dizer (qualquer coisa do género “levanta-te, que isto ainda não acabou”), sacudi o pó e voltei para Lisboa renovado.
Para outros, a solução não é a música. É o ioga, o parkour, o Pilates, a natação, o badminton ou o triplo salto à vara. Não interessa. Whatever works. O que interessa é encontrar o que resulta e para isso precisamos de procurar. Ou seja, só posso vos encorajar a tentarem encontrar o vosso “The Division Bell”. É preciso dar esse passo. Ele está aí, algures, e nada vos dará mais poder sobre o vosso destino do que a procura de encontrarem o que resulta para vocês. Como o meu pai me disse um dia “toma conta de quem está à tua volta, mas ninguém é mais importante que tu”. Tomem conta de vocês.
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