quinta-feira, 20 de julho de 2017

Os Pretenders recusaram-se a dar um concerto sénior e 'suddenly thunder showered everywhere'

A banda de Chrissie Hynde levantou o pó da carpete que cobria o campo dos Parque dos Poetas

São duas e meia da manhã e estou a escrever isto na esperança que finalmente me dê o sono. Não consigo dormir e a culpa é dos Pretenders. Foi uma maravilhosa surpresa. Sabem quando vão a um concerto sem grandes expectativas na ressaca de um dia de trabalho extenuante, mas aquilo acaba por ser tão empolgante que depois nem conseguem pregar olho, tal é a adrenalina a bater no vermelho? Foi isso que aconteceu hoje com o concerto dos Pretenders no Parque dos Poetas.

Mas a coisa não esteve fácil para a banda de Chrissie Hynde. Os Pretenders foram contratados para um festival tranquilo de plateia sentada (chama-se Cool Jazz por alguma coisa) que, numa noite fria como a de ontem (a Rita Redshoes já se tinha queixado quando abriu), previa um concerto morninho, calminho e outros adjectivos cinzentos de grau diminutivo. Mas os Pretenders são uma banda de Rock 'n' Roll e não vieram a Portugal preparados para dar um concerto sénior. E por isso cedo começaram a levantar o pó da carpete que cobria o campo do Parque dos Poetas.

Depois de abrirem o set com uma sequência do novo álbum e o deep cut "Message Of Love", a Chrissie (que não está com merdas) mostrou-se desagradada com a falta de gente a dançar e chamou toda a gente para a frente do palco (lá fui eu a correr). Sacou de "Don't Get Me Wrong" e "suddenly thunder showers everywhere". Chrissie deu um pontapé na letargia do público e de repente, a temperatura disparou. Já não fazia mais frio em Oeiras. "Who can explain the thunder and rain, but there's something in the air". O que havia no ar era Rock 'n' Roll.



Mas desenganem-se se pensam que foi um set apoiado nos êxitos. Os Pretenders têm uma carreira muito longa, mas não têm tantos como isso. O último grande hit já remonta aos mid-90s ("I'll Stand By You") e foi introduzido com um "let's get this out of the way". O que transcendeu o concerto de ontem foi algo muito simples: foi puro Rock 'n' Roll. Solos de guitarra, solos de bateria e canções entregues furiosamente, uma em cima da outra, sempre a abrir. Velhos? Velhos são os que ficam sentados.

O baterista Martin Chambers já leva 66 anos  e não é por isso que denota a idade; está na banda com Christie há 35 anos – "Se tivéssemos feito sexo teríamos durado 6 meses; é o meu máximo", disse Chrissie; acrescentando depois "Too much information, sorry". Martin é um espectáculo dentro do espectáculo. Baquetas ao ar, baquetas para o chão, cuspo para o ar, cuspo para o chão e carregar na bateria como se a vida dependesse disso.

Por falar em espectáculos à parte, o guitarrista James Walbourne está na banda desde 2008, mas parece que nasceu para aquele lugar. Foi ele quem mais brilhou no eléctrico "Thumbalina", um dos pontos altos do concerto, com um riff a fazer lembrar Johnny Marr dos The Smiths. Que besta de guitarrista.

Num set de 18 temas disparados em hora e meia, houve obviamente espaço para os maiores hits. "Don't Get Me Wrong", "Brass In Pocket" e "I'll Stand By You" foram chegando sempre que era preciso arrebitar as linhas mais duras da audiência. Chrissie prestou ainda homenagem a Ray Davies dos The Kinks –  "talvez o melhor compositor de sempre" e "quem começou tudo para mim", confessou –, relembrando o clássico "Stop Your Sobbing".

O meu único senão da noite foi a falta de temas de "Viva El Amor!" – álbum que teve muita tracção em Portugal e que me deu a conhecer os Pretenders em 1999 – , especialmente o single "Popstar", que é uma deliciosa 'revenge song' contra Jim Kerr dos Simple Minds. Jim era casado com Chrissie (8 anos mais velha que ele), mas trocou-a por uma wannabe da Kylie Minogue – a quase actriz / quase cantora Patsy Kensit (que mais tarde também andou com o Liam Gallagher) – e que tinha menos 9 anos que ele. Que idiota, este Jim.
A Chrisssie continua impecável. Aos 65 anos, aquele lendário eyeliner ainda mexe; a voz está igualzinha, uma autêntica powerhouse; e continua a ser a miúda mais cool com uma guitarra na mão. Também confirmou a minha teoria de que a história de que o melhor do mundo são as crianças é uma grande mentira. O melhor do mundo são as roqueiras. Nem que tenham 65 anos.

Grande concerto, a surpresa do ano. Os Pretenders ganharam ontem um fã.


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