quarta-feira, 19 de maio de 2021

Desfolhada Portuguesa: as dez melhores canções portuguesas da Eurovisão

O cronista da NiT lista as melhores canções que Portugal levou à Eurovisão


Estamos em semana de Festival da Eurovisão e hoje Portugal joga o acesso à final de Sábado. Antes de torcer pelos Black Mamba na semi-final de hoje, recordemos algumas das melhores entradas portuguesas do passado, na contagem das minhas 10 canções favoritas que representaram Portugal na Eurovisão. Escusado será dizer que é uma lista pessoal e inevitavelmente influenciada pela minha infância, quando seguia o festival mais de perto. Acho que nunca recuperei da desilusão de ver Rui Bandeira (grande cabelo, ó Rui) afundar na Eurovisão de 1999, a que se seguiram anos negros de fracas prestações e canções esquecíveis, até àquela noite mágica de 2017 em Kiev. Sem mais demoras, vamos ao top 10.

10. Da Vinci — "Conquistador" (1989)


Tendo nascido em Novembro de 1985, no festival de 1989 tinha apenas 3 anos, mas por algum motivo (haverá com certeza uma explicação para isto), todas as minhas memórias mais remotas estão ligadas a música e o primeiro tema que eu tive noção de sair do Festival da Canção foi o "Conquistador" dos Da Vinci. No infantário, foi um hit que martelou a sala ad nauseam, mesmo que na altura ninguém ali soubesse bem do que se tratava. Estávamos no infantário, pois claro. Hoje em dia, um tema inofensivo como o "Conquistador" seria impossível de chegar à televisão. Já estou a imaginar os gritos de "colonialistas", "imperialistas", "racistas" e outras parvoíces que seriam atirados aos Da Vinci. Ah os 80s. Quando nos podíamos divertir com coisas mundanas.

9. Paulo de Carvalho — "E Depois Do Adeus" (1974)


A canção que ficará para sempre ligada à revolução de 25 de Abril de 1974, por ter sido a primeira senha que na noite de 24 deu sinal 'as tropas para estarem a postos para o que aí vinha. "E Depois Do Adeus" não tinha nada a ver com política e por isso mesmo foi o tema escolhido, para não evitar suspeitas. Paulo de Carvalho ficou eternizado naquela noite, depois de uma prestação modesta no Festival da Eurovisão de Brighton, poucas semanas antes da revolução.

8. Dina — "Amor D'Água Fresca" (1992)


Continuamos com as minhas memórias do Jardim Escola (aqui "já" tinha 6 anos), desta vez para um tema de apelo transversal. Amor e frutas, o que há para não gostar? Olhando hoje para trás, "Amor D'Água Fresca" era um peso demasiado leve para a Eurovisão e a Dina, tendo um dom raro para a melodia (raio da música do CDS que nunca sai da cabeça), nao tinha propriamente aquele look de Pop Star necessário para triunfar contra as estampas da Hungria e da Lituânia. É pena, a música era muito boa.

7. Dulce Pontes — "Lusitana Paixão" (1991)


Depois dos Da Vinci em 1989, voltámos a puxar pelo sentimento tuga com a Dulce Pontes em 1991. No prelúdio de uma carreira fenomenal, a Dulce levou a Roma a "Lusitana Paixão", uma ode ao fado, MAS (wink, wink) tinha mais de Stevie Wonder do que de Amália. Não que isso seja mau e a prova é que a Europa gostou e a Dulce teve uma excelente prestação. Bem, pelo menos para o contexto português, que na Eurovisão é de fuga 'a despromoção.

6. Salvador Sobral — "Amar Pelos Dois" (2017)



Mas na Eurovisão, como na bola, de vez em quando aparece um tomba gigantes e até o Sporting ganha o campeonato e Portugal ganha o Festival da Eurovisão. Em 2017, Portugal apareceu em Kiev com um tema que era a antítese de toda a foleirada que a Eurovisão representava e o impensável aconteceu - ganhámos. E não só ganhámos, como ganhámos com a canção menos eurovisionável possível. Na altura muito se escreveu em como a vitória de Salvador Sobral com o belíssimo "Amar Pelos Dois" representava uma mudança de paradigma na música e na Eurovisão. Certo. No ano seguinte, com o festival em Lisboa, ganhou a pior canção que me lembro de ouvir na Eurovisão. O que é que mudou desde então? Nada. Salvador foi um alien na Eurovisão e isso não é necessariamente mau. O alien é nosso.

5. Carlos Paião — "Play-Back" (1981)


Em pleno auge dos sintetizadores, Carlos Paião levou a Synth-Pop portuguesa à Eurovisão, com uma crítica à música plástica e aos cantores sem voz que começavam a proliferar na altura. O tema era brilhante e certeiro, mas a Europa não percebeu e "Play-Back" nao foi além do 18º lugar. Os anos seguintes iriam provar que a carapuça serviu 'a Eurovisão e o Carlos estava certo. Grande Carlos, grande talento.

4. Sara Tavares — "Chamar A Música" (1994)


A Sara foi a Dublin com 16 aninhos para mostrar um vozeirão à Europa e que pena que nao foi além do 8º lugar. Foi uma boa classificação para Portugal, eu sei, mas "Chamar a músicá" apanhou-me na fase de maior euforia com a Eurovisão e a canção era tão boa que estava convencido que íamos ganhar. Uma pena.

3. José Cid — "Um Grande, Grande Amor" (1980)


"Addio, adieu, aufwiedersehen, goodbye / Amore, amour, meine Liebe, love of my life". Se há canção da Eurovisão que entrou para o cânone da cultura popular portuguesa, foi esta ode ao amor emigrante do José Cid. O Zé levou à Holanda um penteado que iria definir os agrobetos ribatejanos durante décadas (conheci uns quantos tirados a papel químico) e uma música para ganhar. Diria até que em toda a história do Festival da Canção, não consigo pensar em tema mais eurovisionável que "Um Grande, Grande Amor". Ok, o título é capaz de ser fatela (já não usava esta palavra há uns 15 anos), mas a canção preenche todos requisitos. Começando pela letra, europeia e acessível. Justificando as comparações, José Cid nunca soou tanto com Elton John como neste tema (aliás, em 1980, Cid soava mais a Elton que o próprio Captain Fantastic e é bastante discutível quem era melhor). José Cid igualou na altura Carlos Mendes na melhor classificação de sempre para Portugal (ficámos em 7º), mas soube a pouco. O Zé merecia mais. 

2. Simone de Oliveira — "Desfolhada Portuguesa" (1969)


Simone, o furacão português, foi a Madrid em Março de 1969 para trazer o caneco da Eurovisão. A aposta era forte, mas fundada. A "Desfolhada Portuguesa" era um tema poderoso e viciante, que se afigurava como um dos principais favoritos à vitória daquele ano. Portugal parou para ver Simone de Oliveira fazer uma interpretação sísmica e atingir... Um inenarrável 15º e penúltimo lugar. "Portugal venceu com o penúltimo lugar", denunciou na altura a revista Flama. A Europa deve ter corado de vergonha quando deu 4 pontos a Simone de Oliveira. Bem, a Europa não sei, mas os espanhóis coraram de certeza, porque correram para o camarim dela para imediatamente lhe pedir desculpas pelo vexame. Vexame deles, claro, que a Simone esteve fantástica. "Sigo cantando", atirou ela, do alto de quem sabe que fez a sua parte. É a rainha do festival da Eurovisão e qualquer lista com as melhores músicas tem que ter a Simone no topo. Bem, a minha não tem, mas já vão perceber porquê.

1. Anabela — "A Cidade (Até Ser Dia)" (1993)


A Anabela foi o meu primeiro grande crush de criança, tinha eu 7 aninhos (ela tinha 16, por isso hey, não é assim TÃO esquisito). Talvez pela minha paixoneta de infância, eu seja tao parcial relativamente à perfeição de "A Cidade (Até Ser Dia)". Para mim, a canção que a Anabela levou à Irlanda continua a ser a melhor que Portugal teve na Eurovisão. É tudo perfeito. Desde o charme urbano das trompetes a anunciar o refrão, passando pelo crescendo vocal até uma nota impossível no refrão ("cidadeeeeee" — na atabalhoada versão das semi-finais do Festival da Canção ela ainda não a arriscava), até à entrada triunfal das backing vocals que complementam na perfeição a voz angelical da Anabela. Já passaram quase 30 anos e ainda me apaixono por ela sempre que recordo o vídeo no Youtube. Se isto não é o poder de uma canção, não sei o que é.

quinta-feira, 13 de maio de 2021

Criptomoeda? Não, discos de vinil

Já terão ouvido os vossos pais e os vossos avós dizer que comprar ouro é o melhor investimento. Não é arriscado como criptomoeda, acções em bolsa, ou fundos de investimento e dá um retorno seguro. Muito bem, mas qual é a piada? A não ser que sejam fãs de numismática, nenhuma. E mesmo se forem, o nível de divertimento é seriamente discutível. Já os discos de vinil? Horas de diversão a comprar e a ouvir e um retorno absurdamente elevado. É plástico envolto numa capa de cartão, certo, mas se souberem "investir", isto é, se souberem o que comprar, o vinil deixa a criptomoeda de rastos. Como? Aqui o tio Nuno explica.

A lógica de mercado dos discos de vinil tem as suas nuances, mas na base, é relativamente fácil de entender — o preço é função directa da raridade do disco e da sua procura. Os discos lançados nos anos 90 e anos 00 (décadas "mortas" do vinil) tiveram prensagens limitadas, pelo que os preços destes discos é invariavelmente alto, mesmo que a procura não seja muito grande. Se a procura for grande, então o preço explode. Um exemplo simples é a discografia dos Radiohead nos 90s. Partindo do princípio que os Radiohead são uma banda muito popular, incluindo nos dias de hoje (12.6 milhões de ouvintes mensais no Spotify), as prensagens originais dos seus álbuns serão sempre caras; tendo sido lançados nos 90s, esse preço dispara; e nos álbuns mais consagrados, o preço é ainda mais obsceno. Senão vejamos: o preço médio da primeira prensagem britânica do "Pablo Honey" — álbum raro, mas pouco popular — são na ordem dos 100€ (dados do Discogs); já as primeira prensagens do "The Bends" e "Ok Computer" (o mais popular, mas também o mais comum) andam à volta dos 200€ — o dobro do "Pablo Honey". Qualquer um destes discos, se o encontrarem "in the wild" (que é como quem diz, perdido numa loja de discos) por um preço razoável abaixo dos 100€, é sempre de compra imediata. O investimento é de retorno garantido.

Aconteceu-me exactamente isto neste fim-de-semana, quando andava no meu record shop tour em Londres. No mesmo dia, em lojas diferentes, vi o "Smile Sessions" dos Beach Boys e o "Singles Collection" do David Bowie, ambos por 50£. Comprei os dois sem pestanejar. Quando cheguei a casa, pus o "Smile Sessions" no eBay pelo triplo do preço e dois dias depois estava vendido. Não o pus à venda, mas se fosse para o eBay, fazia o dobro facilmente. Limpinho, limpinho.

As nuances deste mercado são a chave para saber onde investir. Qualquer edição limitada é à partida um bom investimento, uma vez que quando ficar fora de circulação, o preço automaticamente duplica. E nisto dos discos, nunca há desvalorização. Se o preço por alguma razão duplicar, é aí que fica estabelecido para sempre. A não ser que haja uma reedição e aí quebra um pouco, pelo menos até essa reedição sair de circulação. Depois volta ao mesmo preço, ou a um preço superior.

É preciso também ter em atenção os fenómenos que causam os picos de subida. Já vimos que a saída de circulação (o disco ficar out-of-print) é um deles. A morte do artista é o mais óbvio de todos, sendo o caso mais flagrante a morte de David Bowie, que fez disparar os preços de toda a sua discografia. A prensagem original (e única até hoje) do "Older" do George Michael já andava a precos proibitivos, na ordem dos 100€ a 200€ antes da sua morte. Hoje, o preco médio no Discogs é de 650€. Sim, leram bem. 650€ por um disco de vinil. Falem-me lá agora da valorização da Bitcoin.

Recentemente, temos também o caso da separação dos Daft Punk, que criou um pico de procura absurdo no Discogs, o maior da história da banda. Temos também o caso dos Queen, em que o filme "Bohemian Rhapsody" fez disparar o custo de todos os discos para o dobro. E mesmo se não considerarmos estes picos, a valorização é sempre uma constante, especialmente para os discos mais antigos, cada vez mais difíceis de encontrar em boas condições.

Sou um coleccionador e não um negociante de discos, mas quando vejo uma oportunidade de negócio, não resisto a meter a mão. No ano passado vi uma caixa "The Rolling In Stones in Mono" selada por 300£; pus no eBay a 900£ e em três meses estava vendida pelo preço que estabeleci. Ouro? Não, plástico. Muito mais fixe, tem o bónus de dar música e não estão dependentes da volatilidade dos mercados, das políticas do governo, ou de declarações incendiárias do Elon Musk que vos fazem perder tudo. A vossa colecção de música, para além de cool as fuck, está sempre a valorizar. A música nunca perde valor.