Que interessam o líder da religião Católica, o presidente dos EUA, ou o da Rússia, se nenhum deles esteve nos Beatles?
O Novo Testamento reuniu os Evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João. Paulo, o Apóstolo, também contribuiu para as Escrituras Sagradas com treze epístolas onde pregava a doutrina de Jesus. Quase dois mil anos depois, outro Paulo surge com novos escritos sagrados e uma nova doutrina. The Beatles, chamavam-lhe. "Maiores que Jesus", chegou a atirar João – outro dos novos evangelistas – sobre o impacto das frescas epístolas.
Cinquenta anos mais tarde, esses mesmos escritos continuam a ser celebrados numa festa que transcende gerações, cores e culturas, provando a imortalidade dos novos escritos. Não é a missa, é um concerto de Paul McCartney.
Estou entusiasmado, é evidente. Neste fim-de-semana, fui a Marselha para ver, ouvir e estar perto do homem mais importante do mundo. Papa Francisco? Obama? Putin? Deixem-me rir. Que interessam o líder da religião Católica, o presidente dos EUA, ou o da Rússia, se nenhum deles esteve nos Beatles?
Paul levou ao novo Velódrome o seu Evangelho e tocou 40 temas durante três horas. Tocou sem rede, sem playback, sem grandes props (excetuando em "Live And Let Die" onde foi despejada uma quantidade de pirotecnia de fazer inveja ao réveillon da Madeira), desafinando quando a voz não dava para mais e desafiando as mais ousadas previsões para um concerto de um rocker de 72 anos. Um puro e cru show Rock.
Paul levou ao novo Velódrome o seu Evangelho e tocou 40 temas durante três horas
Com aquela cara de miúdo (que inacreditavelmente ainda mantém), Paul pode não ser o mais convincente dos rockers, mas nem por isso deixa de ser um dos melhores de todos. Já depois de duas horas em palco e de um rol inesgotável de clássicos dos Beatles, Paul arrancou para o último terço do espetáculo com a sequência "Band On The Run" / "Back In The USSR" / "Live And Let Die". Sempre a abrir. E quando chegou ao último encore, ainda teve forças para recuperar um dos berços do heavy rock, "Helter Skelter" e mandar a casa abaixo. Foi a estocada final. Pelo menos para mim, que após 3 horas de espera debaixo de um calor abrasador e 3 horas de concerto a cantar a plenos pulmões, ali perdi os sentidos durante uma fração de segundo e só fui amparado pelo mais próximo fiel de Paul.
No fim, estava demasiado subnutrido, desidratado, exausto para ter a noção do que acabara de presenciar. Só na manhã seguinte, e na outra, e na outra, começou a aterrar em mim a verdadeira dimensão daquela noite. Macca ao vivo é um investimento certo, uma memória que se capitaliza com o passar dos dias, um ativo para o resto da vida.
Foram 3 horas e 40 temas, mas 40 temas que souberam a pouco. Não que a minha voz e as minhas pernas aguentassem mais (já estava mais preso por arames que um treinador no Sporting), mas onde ficaram clássicos como "Sgt. Pepper", "Magical Mystery Tour", "I Saw Her Standing There", "Drive My Car", "Hello, Goodbye", "I'm Down", ou (podia ficar aqui o dia todo) "Get Back"? Imperdoável, Paul.Ok, perdoo-te com uma condição: volta a Portugal e vem evangelizar esta malta. Já temos o Papa Francisco em 2017, tratemos agora de garantir o Evangelho que mais interessa.
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