Contudo, para 2020, o Alive quer mais.
Aparentemente, não foi suficiente ter sugado todo o sumo do Rock ao Rock In Rio, transformando-o numa punchline recorrente de piadas sobre a mercantilização dos festivais e acusações de um Rock In Rio sem Rock, nem Rio. Para 2020, o Alive quer também atacar os alvos Pop, tradicionalmente destinados ao Parque da Bela Vista; e fá-lo num ano em que o autodenominado "maior festival de música do mundo" regressa a Lisboa. Taylor Swift parecia um casamento perfeito com aquela slot historicamente destinada à Britney Spears, Shakira, ou Adriana Grande, mas em vez disso, vai para a slot onde dantes estiveram Arctic Monkeys, Pearl Jam, ou Radiohead. Eu gosto da Taylor Swift, mas não deixa de ser uma evolução bizarra.
Como se não bastasse este ataque à Pop, o Alive apresenta também para a sua edição de 2020 um trunfo do Hip Hop habitualmente apresentado pelo Super Bock Super Rock — Kendrick Lamar. A resposta do SBSR foi A$AP Rocky, mas sente-se que é como quem responde uns Ocean Colour Scene, a uns Oasis. Não é bem o mesmo campeonato. A não ser que venha daí um Kanye West para o Meco, o festival vai ficar claramente a perder.
Com esta aparente viragem à Pop e ao Hip Hop do Alive, o público mais antigo e mais fiel do festival sentiu-se traído. Era óbvio que isto iria acontecer e foi com certeza discutido na organização do festival. Mas tentando ser o mais objectivo possível, o que é que isso lhes interessa? Muito pouco. A verdade é que eles vão atrás do dinheiro. Não há outra maneira de dizer isto e nem é dito em tom jocoso. É um facto. O Alive cresceu a olhos vistos na última década e passou de uma alternativa ao Rock In Rio, ao mais consagrado festival de Portugal. Ganharam o público, penetraram o mainstream e ali se querem estabilizar, uma vez que é no mainstream que estão os sponsors e daí é que vem o dinheiro a sério. E a forma de se perpetuar no mainstream é, teoricamente, seguir os passos do Rock In Rio e conquistar o público da Pop, mais disposto a deixar a nota. "Follow the money", já dizem os americanos.
Mas será que, na prática, esta é mesmo a melhor opção para garantir o sucesso do festival? Não tenho a certeza. Esta viragem tem muitos riscos, começando pelo facto do público da Pop ser extremamente volátil e, ao contrário dos fiéis do Rock, vai-se embora com a mesma facilidade que vem. Mas o Alive está apostado em domar a arte do mainstream sem incorrer no pecado da vulgarização em que se deixou cair o Rock In Rio. Para isso, dá também "uma na ferradura" e vai buscar o mais alternativo Kendrick Lamar. Falta ainda anunciar um headliner e eu aposto que a Everything Is New guardou para o fim um crowd-pleaser o Rock. Os Pearl Jam são uma possibilidade, mas eles estão em Londres nesse fim-de-semana. Aguardemos.
Ao contrário da Bela Vista.
Nem tudo são más notícias para os roqueiros portugueses. A viragem à Pop no Alive abre o flanco para o regresso do Rock... ao Rock In Rio. Esta semana, o festival de Roberta Medina anunciou o nome de Liam Gallagher (obrigado, Roberta!) para o mesmo dia que Foo Fighters e The National, num cartaz épico, reminiscente das gloriosas edições dos Anos 00. A reacção do público foi imediata e logo no dia a seguir, esgotaram os bilhetes do Continente e os vouchers alocados ao dia do mancuniano, o que fez estalar a polémica nas sociais. Uma polémica das que se querem quando se organiza um festival. — quando toda a gente quer bilhetes e não há. Parece fácil, não é? Resta-nos esperar que o Rock In Rio perceba as dicas do mercado e anuncie nomes que se coadunem com a grandeza do festival e a vontade do público para o resto do cartaz. Bruce Springsteen, pretty please.